A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) foi condenada, na 6ª Vara do Trabalho de Brasília, a pagar R$ 1 milhão de indenização por dano moral coletivo. De acordo com o juiz responsável pela sentença, Renato Vieira de Faria, as provas reunidas nos autos evidenciaram a ocorrência da prática de assédio moral organizacional, caracterizada pela instauração de processos administrativos disciplinares que desrespeitavam, por exemplo, o direito ao contraditório e à ampla defesa.
Na ação civil pública, o Ministério Público do Trabalho da 10ª Região (MPT10) denunciou o abuso do poder disciplinar dos Correios com relação aos seus empregados com a instalação de um ambiente de trabalho marcado por terror psicológico. O MPT10 destacou ainda o isolamento de trabalhadores investigados para outros setores – onde não recebiam tarefas – na Universidade dos Correios, local que teria sido apelidado de “Carandiru”.
Em sua defesa, a ECT argumentou que os empregados mencionados no processo foram submetidos a processos administrativos disciplinares durante a vigência do Manual de Controle Interno (MANCIN), entre 2 de dezembro de 1997 e 3 de setembro de 2012. Segundo os Correios, nesse período, não havia previsão de prescrição ou de procedimento preparatório de investigação, o que explicaria a demora das sindicâncias.
Para o magistrado responsável pelo caso, o Ministério Público reuniu provas que demonstraram a disseminação de sindicâncias e processos administrativos disciplinares contra empregados, com durações desarrazoadas, sobre acusações antigas e até mesmo já investigadas anteriormente. O juiz constatou que o abuso de poder diretivo e disciplinar contribuiu para “eternização de conflitos, insegurança jurídica, ambiente de intranquilidade e desconfiança permanentes, assim, potencialmente lesivo à saúde psíquica dos empregados públicos”.
Na decisão, o juiz Renato Vieira de Faria entendeu que essas práticas patronais sistematizadas – embora necessárias à gestão de conflitos internos e à resolução até mesmo de problemas de corrupção deflagrados desde o ano de 2005 na estatal – foram conduzidas sem respeitar as normas jurídicas sobre a matéria. “O processo disciplinar não pode continuar sendo exercido de modo arbitrário quando pretendemos evoluir para ambiente democrático em ordem jurídica iniciada com a expressa previsão, na Constituição da República, de normas de devido processo constitucional”, observou.
Conduta intolerável
A sentença determinou que a ECT não permita, não tolere e se abstenha da prática de atos que caracterizem ou se desdobrem em assédio moral, ou de conduta apta a deteriorar o ambiente de trabalho em decorrência do modo de instauração, condução e conclusão das sindicâncias e procedimentos administrativos disciplinares.
Para a tramitação desses processos, os Correios deverão respeitar os princípios constitucionais, os limites do poder punitivo do empregador e aplicar a Lei nº 9.784, de 1999, para adequação do Manual de Controle Disciplinar da empresa. Em caso de descumprimento, a ECT será multada em R$ 10 mil por trabalhador lesado e por ato abusivo constatado. O juiz também obrigou a empresa a disponibilizar e manter em sua intranet, em local de grande visibilidade para os empregados, uma cópia da decisão judicial.
Dano à coletividade
Conforme o juiz Renato Vieira de Faria, o assédio moral atingiu todas as unidades dos Correios, que possui cerca de 120 mil empregados públicos em todo o país. O dano, nesse caso, assumiu dimensão coletiva.”Foram atingidos diretamente os trabalhadores submetidos a processos disciplinares irregulares, apesar de todos os empregados estarem potencialmente sujeitos aos mesmos procedimentos, mas cumpre ressaltar que o ilícito atingiu o meio ambiente de trabalho e, assim, naturalmente alcançou toda a coletividade com a ofensa ao bem jurídico tutelado no artigo 225 da Constituição Federal”, concluiu.
O valor de R$ 1 milhão arbitrado para pagamento de indenização por dano moral coletivo corresponde a 3% do último lucro líquido divulgado pelos Correios. O montante será revertido ao Fundo de Amparo ao Trabalhador ou a instituição sem fins lucrativos indicada pelo MPT10 para posterior homologação judicial.
Processo nº 0000653-92.2014.5.10.006
Reprodução: Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região – Distrito Federal e Tocantins via JurBrasil
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